quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Livro Todos os Homens são Mortais




Estou lendo um livro que me faz refletir sobre minha vida e existência. Simone de Beauvoir em seu livro “todos os homens são mortais”, conta a trajetória do conde Tosca, um homem imortal cuja vida é marcada por inúmeros acontecimentos que não aconteceriam se esse mesmo personagem fosse um “simples mortal”. Nascido em Carmona, um vilarejo da Itália, Tosca vivencia a guerra, glória, pompa, riqueza e decadência do ser-humano. Ao beber o elixir da vida eterna, Tosca inicia toda uma trajetória de imortalidade representada por uma vitalidade inicial, pois esse homem, agora imortal, deseja conquistar tudo que se encontra disponível: o controle de Carmona, as mulheres que poderiam lhe dar filhos, as riquezas materiais entre outros aspectos que um homem mortal não poderia entrar em contato ao longo de sua curta vida.
Mas com o tempo, a peste se alastra, pessoas vão morrendo, inclusive as mulheres e os filhos do protagonista e a vida de um imortal torna-se vazia, sem sentido, repetitiva e se, grandes feitos, já que o tempo passou e Tosca não envelhecia e nem apresentava traços do processo da morte e do morrer. A personagem principal, inicialmente desperta o interesse de Régine, uma jovem atriz que vivencia cada momento de sua existência da forma mais intensa possível. Ao revelar que Tosca era imortal, ninguém acreditava em suas palavras. Mas Régine resolve ouvir a trajetória de Tosca, desde os tempos imemoriáveis (por volta do século XIII) até o momento em que estivera próximo dela. Tosca era um homem que não sabia como era ser um mortal nem como viver como mortais. Acostumado com o poder, glória e riqueza, foi chamado de tirano por muitos que o viam também como um “morto”. Seu sonho era conquistar o vasto mundo, incluIgreja sive outras terras, pois para si, esse mesmo mundo era tão vasto que deveria ser desbravado por Tosca. Este parte de uma região a outra, desde Carmona até as terras da Alemanha, países ibéricos, Espanha, as terras das Índias onde não havia tantas riquezas como em outros tempos. Esteve junto a governantes e viu pessoas importantes serem mortas por defender suas idéias com “unhas e dentes”.
Tosca preferiu não defender um ponto de vista religioso ou postura específica, estando em contato com o avanço da igreja luterana na Alemanha, os rechaços do Catolicismo e as pregações das ceitas pagãs. Mas nenhuma dessas posturas religiosas distintas o convencera, o que o faz não adotar um ponto de vista particular. O que intriga Tosca é a forma como os mortais levam sua vida já que anseia por ser um homem mortal, coisa que as pessoas mortais em que esteve em contato não desejam mais ser. Morrem muitas pessoas, mas Tosca diz que outras pessoas surgiriam e tudo voltaria a ser da mesma forma, o que era normal para quem nunca fora um sujeito comum. Percebi certa ambiguidade no fato de Tosca ser imortal, fazer muito ao longo do tempo e desejar conquistar o mundo, mas não estar satisfeito com sua condição, desejando se tornar mortal. Ainda preciso terminar de ler para saber como essa relação ambígua vai se desenrolar, já que havia momentos em que a imortalidade levava Tosca a se aventurar pelo mundo. Nós seres humanos mortais, mesmo aprendendo continuar a viver e lidar com a morte, desejamos, ansiamos e esperamos que a imortalidade seja nosso caminho. Essa mesma relação ambígua, no caso de Tosca, era inversa, já que apesar do vigor, da força e da vida “brotando” indefinidamente de seu ser, sente-se sozinho no mundo, vendo todos em suas vidas comuns, frágeis, efêmeras e que se exaurem rapidamente. Não se conforma com a sua existência eterna, mas não pode fazer muito quanto a esse aspecto. Para mim o seu caso se parece com o nosso, mas de outra forma, pois não podemos fazer muito frente ao inevitável fim de nossa existência e Tosca que se encontra prisioneiro de sua infinita vida.
Ao ver que a riqueza, o poder e a vida imortal não traziam nenhum sentido, Tosca inicia uma jornada sem rumo e caminho, levando-o a lugares que outras pessoas jamais conseguiriam chegar através de esforços físicos. Cruzou rios, montanhas, nevascas, vastas florestas, mas via sempre a mesma vida que existira antes. Não havia novidades nem maravilhas por serem descobertas, mesmo com todas as viagens, seus perigos e conhecimentos adquiridos no decorrer das aventuras, Tosca sabia que tudo seria igual, do mesmo jeito e sempre “a mesma coisa”, sem mudanças significativas ao ponto de fazer com que o protagonista encontrasse um motivo para continuar a existir como um ser-no-mundo que todos somos. O cotidiano não proporcionava uma vida mais tranqüila para tosca, pois toda e qualquer realização já havia sido feita e todo e qualquer projeto já havia sido concretizado inicialmente e destruído pelas demais pessoas que eram mortais. A consciência de ser finito e passível de morrer era o que o protagonista buscara e nunca encontrara definitivamente.
Um dos aspectos iniciais do livro que chamaram a minha atenção corresponde ao fato de que Tosca ter formado muitas famílias, mas estar sempre sozinho e sem companhia, pois não morrera antes de seus herdeiros. Temia perder seus entes queridos, mas não podia fazer muito também quanto a esse aspecto. Tosca precipitou-se ao ingerir o tal do “elixir”, mas já não poderia fazer mais nada para evitar o que lhe acontecera. Viu seus primeiros entes morrerem na peste, os outros nas guerras, mesmo que tentasse isolá-los do mundo e dos conflitos, questões existenciais e da vida de forma geral. Considero muito complicado lidar com o fato de que um pai ou um marido ver seus filhos e suas mulheres morrerem e não poder fazer quanto a esse fato que já se encontra consumado. Somos prisioneiros de nossa finitude e Fosca se encontra atrelado a eternidade, ou seja, não há caminho para ambos.

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